quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Frans Krajcberg: uma vida de luta por um mundo melhor


Da destruição surge a beleza. O renascimento de algo considerado morto. É isso o que nos prova o artista plástico polonês Frans Krajcberg.
Frans, agora com 88 anos, já passou por muita coisa em sua vida. Atravessou duas guerras. Perdeu toda a sua familia. E chegou ao Brasil em 1950, fugindo do holocausto. Fugindo da guerra se deparou com outro problema: a destruição da floresta. Aqui, logo quando chegou, começo a lutar contra a devastação. Nos quase sessenta anos que está no Brasil, já denunciou queimadas no Paraná, a exploração de minérios em Minas Gerais, o desmatamento da Amazônia e defendeu as tartarugas de Nova Viçosa, cidade do sul da Bahia onde atualmente mora. Além disso, também ficou na frente de um trator para evitar a construção de uma avenida em sua cidade. Um exemplo de luta em ajuda ao meio-ambiente.
Depois da guerra e com sua chegada ao Brasil, Frans se escondeu, no ínicio, nas motanhas. O artista vivia sem conforto, a barba por fazer, tomava banho no rio e trabalhava sem parar. "Eu não suportava viver depois da guerra. Foi muito brutal para mim. Fiquei sozinho no mundo. Toda a minha família foi morta. Não tenho parente, não tenho nada." Mas independente de tudo o que passou encontrou sua felicidade quando conheceu a natureza brasileira. "Ela me salvou. Sorria para mim e nunca perguntava de onde eu vinha ou que religião eu tinha. Foi quando descobri a vida."
Frans vive há 30 anos em uma casa feita sobre um tronco de pequi, a 7 metros do chão, em seu sítio a beira-mar em Nova Viçosa. Em um lugar ladeado por mangues e Mata Atlântica, o artista cita a importância de aproveitar o instante e saber olhar para as coisas. "Um dia nunca é igual ao outro", diz.
Krajcberg se tornou conhecido mundo afora ao modelar árvores derrubadas, troncos e galhos aparentemente sem vida, que juntamente com sua critividade e habilidade, renascem em belas esculturas. Suas esculturas mostram que por mais que o homem a destrua, a natureza nunca está morta. "Quero que minha obras sejam um reflexo das queimadas. Por isso, uso as mesmas cores: vermelho e preto, fogo e morte", diz ele em protesto do que chama de barbárie do homem contra o homem e do homem contra a natureza.
Em relação à arte, o artista diz que a missão dela é acompanhar a evolução do homem e se não faz isso está servindo apenas ao comércio. "A arte como conhecemos hoje, é feita para o mercado. Não se fala em estilo, linguagem, mas apenas em valor."
Um amante da fotografia, Frans acorda cedo em seu sitio e sai fotografando flores. "É a fotografia que está nos apresentando a degradação ambiental da Terra. É algo que o cinema, por exemplo não fez. Nem a pintura.", diz. Tanto é verdade, que vemos vários fotográfos dedicando muitos trabalhos especialmente ao desmatamento da Amazônia, como o fotografo Rodrigo Baleia, Adriano Gambarini, entre outros. "O que temos hoje? Uma revolução tecnocientífica, um vazio político absoluto e, pela primeira vez na história, uma preocupação com a saúde do planeta. Esse é o tema urgente do século 21, mas até agora esquecido pela arte. A única arte sintonizada com ele é a fotografia."
O tipo de arte feito por Frans e sua dedicação com relação às floresta - não apenas em relação a vegetação, mas também aos índios e a cultura que encontramos nas regiões atingidas pelo desmatamento - pode ser explicado por dois acontecimentos marcantes de sua vida. Antes de chegar ao Brasil, Frans lutou durante quatro anos e meio como oficial do exército durante a guerra. Quando chegou a Polônia com o exército russo, libertou um campo de concentração cheio de húngaros. Mas entrando no campo, viu três motanhas de lixo: "eram homens empilhados para serem queimados no crematório", conta ele. Anos depois, já no Brasil e viajando pela Amazônia, no alto do rio Juruema, no Mato Grosso, ele observou nuvens de urubus. "Aproximei-se com o barco, entrei na floresta, fechei os olhos e fiz uma foto. Eu jamais havia visto cena tão bárbara: seis índios pendurados numa árvore, com centenas de urubus ao redor. Fiz a foto com os olhos fechados."
Diante de tais acontecimentos, vemos que Frans encontrou em sua arte - que usa restos de árvores de locais que foram queimados e desmatados - um modo de se expressar. Em uma entrevista ele disse: "Com tudo que aconteceu diante de mim, que tipo de arte me resta fazer? Pintar flores para senhoras? Ou mostrar esse barbaridade, essa destruição, de modo a alertar sobre a salvação de uma floresta, a Amazônia, de que o planeta tanto precisa? Ela está sendo destruida como fizeram com a Mata Atlântica!".
Entrando agora no assunto pelo qual Frans mais luta - a preservação das florestas - percebemos como o artista é lutador e corajoso. Com suas esculturas ele mostra a realidade de nossas florestas, dos índios e dos problemas ambientais, tão discutidos atualmente. Mas com relação a essa crescente discussão ele esclarece: "O ambientalismo é uma moda, uma tendência. O conceito agora é: salvar a natureza mas também explorá-la. Investidores estrangeiros estão comprando terras na Amazônia com objetivos desconhecidos. Ninguém questiona. Este é o ponto sempre: lucrar individualmente. O país vai ser destruido ao plantar soja transgênica para vender à China para ela alimentar porcos enquanto nosso povo tem fome. É justo isso?"


A destruição e a exploração do planeta chegou a um ponto extremo, que não dá mais para continuar. Não podemos mais viver baseados no sistema vigente de compre, descarte, compre outro novo; explore ao máximo e polua sem ver as consequências. Esse é um sistema falido. Segundo Frans, " o homem deve parar de explorar petróleo, de aquecer a atmosfera, antes que seja tardes de mais". É uma verdade. Por mais que ela seja dura. "O planeta Terra está na UTI. A temperatura está aumentando", completa ele.
Outro grande problema atualmente também é com relação aos índios. Nós roubamos os lugares onde eles viviam, estamos destruindo os que ainda restam e já destruimos grande parte de suas culturas. E Frans está muito correto em dizer que "geralmente esquecemos de que nas florestas existem brasileiros, cidadãos que são queimados, desalojados, excluídos. Em Porto Velho, em Rondônia," - conta ele - "vi índios morando na rua, pedindo esmolas, por que foram desalojados de sua terra. Precisamos deixar os índios viverem a vida deles, sem interferência. Eles são os habitantes legítimos desse país."
Frans Krajcberg, uma pessoa que mesmo passando por tudo que passou, não desanimou de viver e descobriu algo muito mais importante: ajudar sempre! Não importa que seja uma planta, um animal ou uma pessoa. Todos tem a mesma importância no nosso grandioso planeta Azul.

"Como posso gritar? Se grito na rua, vão me levar ao hospital como doido. Eu gostaria de mostrar as três motanhas de corpos do campo de concentração, mas não tenho essa foto, ou botar a imagem da árvore com os índios na exposição que fiz em São Paulo. Mas isso não consigo. Então, trouxe comigo pedaços de árvores, que o fogo deixou, unidos em escultura. É o único grito que posso dar, para mostrar minha revolta contra uma sociedade que só sabe exibir brutalidade do homem com a vida. Está na hora de parar com isso."

Referência: Revista National Geographic Brasil - Seção "Vozes" (Edição 106 - Janeiro de 2009)
Site Planeta Sustentável

Notícias e reportagens sobre Frans Krajcberg:
Frans Krajcberg ganha Pavilhão no Parque do Carmo

A morte na vida e na arte
Frans Krajcberg: revolta em forma de arte

Frans Krajcberg critica o vazio artístico

Frans Krajcberg: natureza inquieta
(Reportagem da National Geographic, disponibilizada no site Planeta Sustentável)

Um comentário:

  1. Frans só tenho a lhe agradecer...me falta palavras.Só lamento que não tenho mais aquela foto que tiramos ai no sitio,mas em breve vou ai....

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